João Livra
1987. São Paulo, Brasil
Vive e trabalha em São Paulo

Exposições individuais:

2014 Pátina Amarelo-suja - Oficina Cultural Oswald de Andrade - São Paulo (Curadoria Tobi Maier)

2022 Desinteligência - Quase espaço - São Paulo (Curadoria Guilherme Teixeira)

2023 Forte Abraço - Delirium - São Paulo

2024 Burro - Massapê - São Paulo (Texto Marina Wisnik)

Exposições coletivas:

2006 Os laranjas - Galeria Fradique - São Paulo

2008 Caminho - Espaço Cultural Casa de Quem - São Paulo

2011 Projeto volante - Arte postal Brasil - Quebec, Canadá

2011 Título - Espaço Cultural Serralheria - São Paulo

2012 90 anos Semana de arte moderna - Galeria PontoArt - São Paulo

2012 Embaixada do Brasil de arte postal - Buenos Aires, Argentina

2012 I Bienal Internacional de Guarulhos do pequeno formato - BIG Guarulhos

2012 Pintura Original - Oficina Cultural Oswald de Andrade (Orientação Marcia de Moraes e Bruno Moreschi) - São Paulo

2013 Horizonte - SP ESTAMPA - Galeria Gravura Brasileira - São Paulo

2013 Lista - Galeria LOGO - São Paulo

2013 Feira Plana - MIS Museu da Imagem e do Som - Acervo de publicações da biblioteca Walter Wey - Pinacoteca de Sāo Paulo

2013 É fluido mas é legível - Oficina Cultural Oswald de Andrade - São Paulo (Orientação Nino Cais e Marcelo Amorim)

2013 72º Salão Ararense de Artes Plásticas “Antônio Rondini”

2014 21º Salão de Artes Plásticas de Praia Grande

2014 Surprise - Ateliê 397

2024 A retomada - Quase espaço - São Paulo

2024 Ainda viva - Curadoria de Bruna Costa e Paula Borghi - Casa de Cultura do Parque - São Paulo

TEXTOS

BURRO - 2024

MARINA WISNIK

A poesia é, por excelência, o espaço onde se criam novos espaços. Seja na linguagem verbal, visual, sonora, ela se dá pela combinação de elementos que, justapostos, contrapostos, propõem um deslocamento de olhar, construindo novos lugares, multiplicando-os.

A expressão de João Livra tem como pulso e respiro a linguagem poética, seja nos seus trabalhos em arte contemporânea; seja no seu gesto de transformar espaços, descascando paredes e revelando outras camadas do tempo na matéria; seja nos seus textos ainda desconhecidos do público, que já reluziram por um curto momento no mundo virtual, cujo conjunto era intitulado “entra mudo sai calado”: um espaço branco que abrigava seus poemas flutuantes.

Nascido na Zona Leste de São Paulo, e interessado pelos arranjos vernaculares, João Livra tem um olhar muito próprio para as resoluções de improviso tão características da cultura brasileira, presentes na construção civil e no comércio popular. Desenvolvendo uma poética calcada no universo da gambiarra, as suas produções plásticas combinam uma certa agressividade, ou contundência, ao signo da leveza, suspensão e elegância.

Esse aspecto já está presente na sua primeira individual, Pátina Amarelo-suja, 2014, quando pendura, ao avesso, duas clássicas mesas de camelô de lona azul, transformando-as num objeto suspenso, estrelar (Capital, capital, capital, 2014); quando corta a sala expositiva com um vergalhão retorcido, que perfura implacavelmente alguns azulejos (Revestimento-vítima, 2014), ou nos trabalhos que fez isoladamente na pandemia: (Hecatombe, 2021), uma camisa da seleção brasileira preenchida por um jato de ar, tomando vida e fenecendo como um corpo insustentável; ou imensos balões de papel seda, um preto e um vermelho, preenchidos junto a fumaça no período das mortes pela pandemia (Ato oblíquo, 2021).

Nessa quarta exposição solo, Burro, ele explora algumas séries que já realizou em trabalhos anteriores, agora, com outra abordagem. Utilizando materiais como serrinha, bloquinhos gráficos e a curva francesa, presentes nas individuais Desinteligência, 2022, e Forte Abraço, 2023, Livra vem destilando o exercício da síntese, ao escolher um ou dois elementos da cultura popular que, juntos, vão construindo novas leituras e espaços. Espeto, serra, dispositivos institucionais, organizados sinteticamente, contrapostos, justapostos, criam relações de magnetismo entre si. Como um poeta do design, ele observa o universo da gambiarra, do improviso, do precário e acaba por recriá-lo de maneira provocativa, minimalista, elegante, suspensa.

PÁTINA AMARELO-SUJA - 2014

TOBI MAIER


Após várias intervenções no prédio da Oficina Cultural Oswald de Andrade nos últimos anos, Livra participou da Primeira ocupação em 2012 e da mostra É fluido mas é legível em 2014, a mostra PÁTINA AMARELO-SUJA e a primeira individual do artista e também acontece no mesmo lugar. Livra assim parte onde ele deixou as ferramentas parados na ultima vez. Seguindo as suas intenções o artista faz as esculturas criadas para a ocasião dialogar com o próprio prédio. Para PÁTINA AMARELO-SUJA Livra utiliza processos comuns inerentes à construção civil e à pintura popular, criando interferências na arquitetura do prédio da Oficina Cultural Oswald de Andrade e trazendo essa materialidade para o espaço expositivo.

Trabalhando “em situ” desde meados de agosto ate a abertura em setembro de 2014, Livra transformou partes da Oficina Cultural em seu estúdio e laboratório, aberto para o publico acompanhar os seus processos de criação. O contexto da exposição, assim, envolve diretamente a noção de ponto de vista e busca o diálogo com o espectador. Um ponto de vista implica coisas que não são estáticas, que estão em discussão, no processo de serem feitas. Tocar a arquitetura de um lugar é tocar o seu significado, sua história. O espírito de um lugar envolve a sua vida, as pessoas que ali vivem, que o fazem funcionar.
A exposição de João Livra leva esses pontos em consideração, a arquitetura e os elementos arquitetônicos são pontos de ancoragem para as obras apresentadas, que em conjunto formam uma instalação. Na fachada do prédio encontram-se telas sinais, conectando o espaço publico ao ar livre com as galerias da Oswald de Andrade (Velatura e vão, 2014). Ao entrar a Oficina Cultural Oswald de Andrade o visitante e confrontado e recebido por Espaço comum, um tapume rosa que no Brasil conhecemos como um material cotidiano da construção, usado temporariamente. Livra revestiu algumas dos painéis de madeira que habitualmente funcionam como dispositivo para as obras mostradas na galeria. Assim o artista fez estas paredes desaparecer - os painéis viram suporte para uma escultura que se estende e intervém na grande hall da Oficina Cultural.

Após entrarmos nas galerias enfrentamos, na extrema do espaço expositivo, uma outra parede revestido por chapas de aço que bloqueia a vista pelas janelas. De certo modo esta obra Impermanência (2014) dialoga com as tapumes rosas e balanceia o espaço expositivo. Ela faz parte de um cenário que nos acolhe: imaginamos diferentes figuras, habitantes do bairro, visitantes do centro e trabalhadores que vêm para o espaço realizar diferentes tarefas como, por exemplo, a colocação de um pavimento, produzido a partir de uma espécie de parafina (Não é concreto, 2014). Esta parafina assemelha-se de sabão e atrai um forte desejo de contato háptico. Ao lado, o artista criou um barril a volta de uma coluna do prédio dotados com um revestido de pastilhas turquesa. A obra criada por Livra não somente comenta sobre um material frequentemente aplicado em banheiros e cozinhas contemporâneos, mas vira pedestal para a coluna, um suporte do próprio prédio.

Outras obras de Livra trazem referências dos vendedores ambulantes na cidade: Remoções é exibido no chão da galeria. Em vez de apresentar mercadorias novas, produzidas de baixo custo, como DVD’s ou T-Shirts, a lona transparente aqui serve para coletar e honrar os resquícios arqueológicos de uma pintura de parede, descascados, revelando as camadas, as pátinas de história que estão abaixo das construções remodelados.
Apresentado ao lado é Capital Capital Capital, uma barraca de lona e madeira, também frequentemente usada por vendedores ambulantes. Como um sinal de rejeição ou abandono da operação comercial a mesa está a fazer as asas como se quisesse desertar da apresentação tediosa do produto novo. A mão de obra do artista esta presente na mostra inteira. A aversão a insânia de construção em cima de em alguns prédios históricos da cidade e a remodelação de apartamentos antigos esta violentamente representado em Revestimento-vítima. Um “piso frio”, frequentemente aplicado por donos imprudentes de apartamentos antigos é perfurado e tostado por uma barra de aço. As marcas da cerâmica furada deixam umas padrões abstratas randômicas em cima da cor branca dos azulejos. Reencontramos as bolinhas de cerâmicas cortadas na balança da obra Novo­voraz na segunda sala da mostra. Assim as esculturas refletem a ideia do readymade, discutem as decisões tomadas pela indústria para as massas, e a transação comercial quotidiana. Ainda na segunda sala Livra trabalha sobre a redução da pintura a um mínimo, a ideia da ferramenta visual como um oposto absoluto a pintura, que é uma expansão do ato de olhar. Represa e Expositor I representam objetos reduzidas a uma expressão simples dentro de um determinado lugar. Particularmente Represa evoca as obras tarjas do Daniel Buren, historicamente aplicadas em lugares públicos (prédios ou placas de anúncios comercias). Porém Livra apropria um material diferente, lona plástica, e torna ela em elemento escultural que meandra pela parede dispositiva e a janela que, clandestinamente, conecta as duas salas expositivas. Como um legado para sua prática como um pintor, voando acima de tudo e ainda espremido em um canto da sala, a pintura de parede Base acentua as formas minimalistas que dominam a sensação geral da exposição.

Em conjunto, as obras aqui apresentadas estão interligadas em uma complexa rede, cuja sistemática imanente está conectada a uma estrutura dinâmica e narrativa. É, como num jogo de pinball, balanceamos as nossas expectativas quanto ao espaço e as obras presentes. Confrontado com este cenário temos de considerar o potencial funcional dos materiais. Os espaços, as intervenções para os mesmos, as obras colocadas e/ou dispostas nesses espaços, as atividades, textos, eventos e ocorrências planejadas ou imagináveis ​​- tudo isso em conjunto constitui uma complexa constelação de possibilidades. Estas possibilidades se tornam experiências, através de uma convivência com os objetos que têm sido usados e modificados pelo artista. Ou, nas palavras do poeta brasileiro Manuel Bandeira: “só é verdadeiramente vivo o que já sofreu”.

DESINTELIGÊNCIA - 2022

GUILHERME TEIXEIRA - DEZ FASES

Dez pés de cabra, madeirite, curva francesa, limões, serra, rebites, correntes, isqueiro, abridor, caneta, papel (oh, dois reais!), fita, vidro, cigarros (oh, derby!), desempenadeiras, espelhos, oceano, confiança, giz (oh, sinuca!), decepção.

Nove pés de cabra, compensado, esquadro, laranjas, vaivém, cegos, veneziana, de bolso, borboleta, esferográfica, papel (oh, cinco reais!), crepe, comum, cigarros (oh, marlboro!), cabo fechado, planos, atlântico, confiança, giz (oh, bilhar!), decepção.

Oito pés de cabra, MDF, alfaiate, abacaxis, serrote, standard, grumet, maçarico, elétrico, gel, papel (oh, dez reais!), silver tape, temperado, cigarros (oh, eight!), plástico, côncavos, pacífico, confiança, giz (oh, snooker!), decepção.

Sete pés de cabra, MDP, costura, acerolas, de costas, boleados, elo português, zippo, de lado, tinteiro, papel (oh, vinte reais!), isolante, laminado, cigarros (oh, charm!), corrugada, convexos, índico, confiança, giz (oh, billiard!), decepção.

Seis pés de cabra, OSB, escalímetro, tangerinas, de chavear, multigrip, Cartier, elétrico, para canhotos, ponta de feltro, papel (oh, cinquenta reais!), antiderrapante, blindado, cigarros (oh, L&M!), dentada, barrocos, ártico, confiança, giz (oh, mata-mata!), decepção.

Cinco pés de cabra, aglomerado, compasso, ameixas, de joalheiro, trevo, rabo de rato, de plasma, progressivo, rollerball, papel (oh, cem reais!), dupla face, colorido, cigarros (oh, gudang!), de aço, bizotado, atlântico, confiança, giz (oh, carambola!), decepção.

Quatro pés de cabra, sarrafeado, transferidor, limas, meia-esquadria, flor, cordão baiano, de cachimbo, europeu, brush, papel (oh, duzentos reais!), para demarcação, aramado, cigarros (oh, Carlton!), lisa, veneziano, báltico, confiança, giz (oh, bola 8!), decepção.

Três pés de cabra, naval, flexível, amoras, costinha, estanque, fígaro, Bic, verona, marcador, papel (oh, euros!), veda rosca, insulado, cigarros (oh, bola 9!), de grafiato, vitorianos, glacial, confiança, giz (oh, sinuca!), decepção.

Dois pés de cabra, compensado, triangular, mexericas, de ponta, ranhurado, Singapura, recarregável, manual, nanquim, papel (oh, dólares!), banana, float, cigarros (oh, minister!), de espuma, provençais, azul, confiança, giz (oh, bola 10!), decepção.

Um pé de cabra, virola, trena, maracujás, crosscut, estruturais, americana, à prova de vento, Suíço, hidrográfica, papel (oh, ienes!), durex, impresso, cigarros (oh, camelo!), dentada, redondos, vermelho, confiança, giz (oh, quando a branca cai!), decepção.